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Fraudes na cota de gênero já cassaram o mandato de dez vereadores eleitos em 2024; ainda há mais de cem na mira

Até o momento, houve cinco condenações, nas cidades de Melgaço (PA), Vilhena (RO), Castro (PR), Varginha (MG) e Brejo da Madre de Deus (PE).

O impacto maior foi na chapa paraense, que registrou a cassação de quatro eleitos pelo MDB. A medida ocorreu devido a ação movida pelo Ministério Público após uma das candidatas inscritas ter sido impugnada por não ter apresentado suas contas eleitorais em um pleito que disputara anteriormente. A substituta sequer realizou atos de campanha e teve votação zerada.

— Há 20 anos os partidos alegam que não conseguem cumprir a lei por não haver mulheres interessadas na vida política. Os dirigentes não cumprem a legislação, não investem 5% do fundo partidário na formação de lideranças femininas e chegam às vésperas do pleito sem investir na base — avalia a especialista em gênero Ligia Fabris, professora visitante na Universidade de Yale.

Além das cinco condenações, possíveis laranjas são investigadas em casos que já tiveram repercussão. O GLOBO identificou ações em ao menos seis capitais — João Pessoa, Manaus, Recife, Porto Velho e São Paulo.

As denúncias impactam chapas de políticos de vulto nacional, a exemplo da ex-deputada Janaína Paschoal, eleita vereadora pelo Progressistas, partido alvo de uma ação após acionamento do PT. Fora das capitais, em Balneário Camboriú (SC), Jair Renan, filho do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), pode ser afetado em processo similar. O PL, acusado de inscrever candidatas laranjas, elegeu seis vereadores no município.

Usualmente, as mulheres envolvidas nessas ações negam a possibilidade de terem sido usadas em candidaturas fictícias. Uma exceção, contudo, ocorre em São Luís, capital do Maranhão, onde dois candidatos do PL entraram com uma ação contra o Podemos, que elegeu três representantes.

Os processos afirmam que a candidata Brenda Carvalho recebeu R$ 300 mil de recursos partidários, mas não fez campanha. Ela teve 18 votos. Após ser derrotada nas urnas, ela registrou, em 14 de novembro, uma ocorrência na Polícia Federal na qual relatou ser vítima de ameaça por ter se recusado a assinar documentos sobre repasses financeiros da legenda.

Brenda admite não ter feito campanha, mas garante que não recebeu dinheiro do partido. “Basta ver para onde o dinheiro entrou e saiu da conta. Eu sou vítima. Se tivesse usado qualquer valor, no mínimo teria uns 700 votos”, afirmou.

A candidata de São Luís não é a única que admite não ter feito campanha nas eleições de outubro. Em Anápolis, no interior de Goiás, Soraya Mafra relatou, em testemunho ao cartório eleitoral, ter sido usada como laranja. Procurada pelo GLOBO, ela chegou a marcar uma entrevista, mas desistiu de falar.

A versão de Soraya Mafra é contestada pela defesa do Podemos, que afirma que ela teria mudado o comportamento após perder a eleição. Ela teve dez votos.

— Essa moça não é candidatura fictícia. Ela praticou atos de campanha, fez programas eleitorais, fez santinhos, gravou vídeo — diz o advogado do Podemos, Luciano Hanna.

Em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, o Ministério Público Eleitoral investiga possíveis irregularidades na chapa do PSDB/Cidadania. Além de não ter tido nenhum voto no pleito, uma das candidatas recebeu R$ 9,4 mil de recursos partidários, valor que transferiu via pix para a sua nora, que concorria à eleição por outro partido, o PSD. Procurada, a federação não se posicionou.

Criada em 1997, a cota de gênero não gerava grandes complicações aos partidos até 2018, quando o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) endureceu as punições e passou a cassar toda a chapa em casos de descumprimento.

Apesar das punições do TSE, as siglas têm conseguido se reerguer, sobretudo finaceiramente, após a reprovação de suas contas, já que, geralmente, dois anos após cada pleito o Legislativo tem aprovado anistias que as isentam de devolverem o dinheiro destinado a campanhas de laranjas.

A última aprovação ocorreu em agosto, quando o Senado deu aval a uma Proposta de Emenda à Constituição que ficou conhecida como a PEC da Anistia. Quando esses textos são aprovados, as contas antes reprovadas pelos tribunais perdem o objeto a partir da mudança de legislação.

A PEC da Anistia criou outra regra para as eleições, mas relacionada à cota racial. A proposta estabeleceu que candidaturas de pretos e pardos recebam ao menos 30% de recursos públicos. A lei anterior estabelecia uma proporcionalidade direta em relação ao número de candidatos inscritos.

Os partidos entenderam que esta legislação já estaria vigente para o pleito deste ano, mas a lei só passa a valer para eleições um ano após a data da aprovação. Dados preliminares da Justiça Eleitoral apontam que a maior parte dos partidos não cumpriu o repasse proporcional para negros e pardos. Segundo informações apuradas pelo Ministério Público Eleitoral, a maior parte das siglas teve mais de 40% dos candidatos negros, mas destinou cerca de 30% dos recursos a eles.

O Globo

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